Por Dr. Deivis O. Guimarães*
Uma nova era para os suplementos funcionais
O mundo mudou e, com ele, a forma como cuidamos da nossa saúde, pois não se trata mais apenas de tomar uma vitamina pela manhã ou um comprimido de ômega 3 no fim do dia, mas sim de compreender que a nova geração de suplementos é fruto direto da revolução biotecnológica, com produtos desenvolvidos a partir de processos sofisticados como fermentação de cepas probióticas específicas, bioencapsulamento de compostos ativos e uso de nanotecnologia para liberação dirigida, o que coloca a nutrição funcional em um novo patamar, atravessando a fronteira do que antes era considerado possível.
Transformar uma ideia inovadora em um produto que chega com segurança, estabilidade e eficiência ao consumidor não é tarefa simples, pois escalonar a produção de suplementos biotecnológicos é um verdadeiro teste de fogo para cientistas, engenheiros, gestores e reguladores, exigindo a construção de pontes entre a pesquisa de ponta e a prateleira da farmácia.
Neste artigo, convido você a explorar comigo os caminhos, os atalhos e os abismos dessa jornada.
O que mudou: de vitaminas genéricas a soluções inteligentes
Se antes os suplementos serviam apenas para “complementar” carências nutricionais, hoje eles têm um papel cada vez mais terapêutico, preventivo e personalizado, reflexo de um entendimento mais profundo da relação entre alimentação, microbiota intestinal, sistema imune, cognição e inflamação crônica.
Os consumidores também mudaram e, mais do que produtos com comprovação científica, rótulos limpos, certificações internacionais e origem transparente, querem resultados concretos, o que pressiona a indústria a buscar soluções mais eficazes, e é justamente nesse contexto que os ativos biotecnológicos ganham protagonismo.
Ativos biotecnológicos: os novos protagonistas
Imagine probióticos que chegam vivos ao intestino e são programados para interagir com determinadas vias neurológicas, ou peptídeos que atuam como anti-inflamatórios naturais, ou ainda fitonutrientes encapsulados em nanopartículas que escapam da acidez gástrica e são liberados apenas no local-alvo, pois tudo isso já é realidade em laboratórios de biotecnologia e redefine o conceito de suplemento.
Esses ativos não apenas ampliam o potencial terapêutico dos suplementos, como também exigem que a indústria repense completamente seus processos produtivos, já que lidamos com compostos sensíveis, de estrutura complexa e comportamento biológico altamente específico, o que eleva o grau de sofisticação das etapas industriais.
Escalonar: entre o sonho da inovação e a realidade da indústria
Nada é tão simples, e é no momento de escalonar que surgem os verdadeiros desafios, pois uma coisa é obter resultados promissores em bancada, outra bem diferente é replicar esses resultados em larga escala com estabilidade, segurança e viabilidade econômica.
Probióticos vivos, por exemplo, variam com temperatura, pH, tempo e condições ambientais, e produzir milhões de sachês com a mesma carga microbiana e atividade funcional exige processos extremamente robustos de controle e validação, o que nos leva diretamente à necessidade de infraestrutura especializada, com biorreatores computadorizados, sistemas de liofilização, câmaras frias com sensores inteligentes, encapsuladores e tecnologias de embalagem que garantam a proteção do ativo durante toda a cadeia.
As oportunidades são tantas quanto os desafios
É justamente por exigir tanto que o mercado de suplementos com ativos biotecnológicos se mostra promissor, pois poucos conseguem entregar com qualidade e consistência, o que abre espaço para diferenciação e valorização do conhecimento aplicado.
Com a personalização dos tratamentos se consolidando como uma tendência global, e com a possibilidade de desenhar suplementos sob medida com base em exames, perfil genético e análise do microbioma, não restam dúvidas de que caminhamos para uma abordagem mais precisa e efetiva, onde cada organismo receberá aquilo que de fato necessita.
Um case do mercado: a empresa americana Thorne HealthTech com personalização e inovação na prática
Um dos exemplos mais emblemáticos dessa nova abordagem é o da empresa americana Thorne HealthTech, que desde o início se propôs a desenvolver suplementos altamente personalizados, combinando biotecnologia, inteligência artificial e testes diagnósticos de precisão para criar soluções únicas para cada indivíduo.
Seu crescimento acelerado no mercado global ocorreu justamente por oferecer não apenas produtos, mas experiências completas baseadas em dados reais de saúde, como análises de microbioma, exames de sangue e testes genéticos, tudo isso aliado a plataformas digitais que conectam os resultados às soluções mais adequadas.
A empresa também se destacou por investir em ensaios clínicos robustos e por garantir rastreabilidade total de suas matérias-primas, conquistando a confiança de consumidores e profissionais de saúde em mais de 35 países.
A solução nanotecnológica da GOn1 Biotech
Outro exemplo é a empresa brasileira GOn1 Biotech, que para entregar probiótico de forma segura e eficiente a crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), desenvolveu um processo de nanotecnologia inédito e exclusivo, garantindo a proteção das cepas em condições adversas e a liberação controlada dos microrganismos no intestino com máxima eficiência terapêutica.
O produto final, além de manter alta biodisponibilidade e estabilidade, pode ser armazenado fora da geladeira por até dois anos, o que representa um diferencial logístico importante, especialmente em regiões com infraestrutura limitada, superando as soluções anteriores que dependiam de cadeia fria e apresentavam riscos de perda de viabilidade.
Com eficiência clínica comprovada e potencial de impacto social elevado, a abordagem da GOn1 demonstra como a biotecnologia pode romper barreiras tradicionais e abrir caminhos reais para o tratamento não farmacológico em populações vulneráveis.
Reflexões finais
O futuro dos suplementos não está nos sabores ou nas embalagens coloridas, mas sim na biotecnologia, na capacidade de entender profundamente os processos biológicos e de desenvolver soluções que respeitam a individualidade humana, produzindo em escala com qualidade, segurança e impacto real, e quem souber trilhar esse caminho com inteligência e propósito estará ajudando a transformar a saúde de milhões de pessoas.
Referências Bibliográficas
FAO/WHO. Probiotics in food: Health and nutritional properties and guidelines for evaluation. Rome: Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2020.
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Sanders, M. E. et al. Probiotic use in clinical practice: what are the risks? Nutrition in Clinical Practice, v. 33, n. 6, p. 806–814, 2018.
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Mahler, G. J. et al. Biotechnology in dietary supplements: Trends, challenges, and innovations. Trends in Biotechnology, v. 38, n. 7, p. 673–686, 2020.
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GOn1 Biotech Clinical Research Group. Dados clínicos internos do estudo K11 em crianças com TEA. Documento técnico, 2024.
*Pesquisador e Diretor de pesquisa da Gon1 Biotech
Doutor Honoris Causa em Biotecnologia aplicada em saúde
Doutorando em gestão e tecnologia industrial: desenvolvimento de novos produtos